“A Rocinha inteira é o acervo do Museu Sankofa Memória e História da Rocinha (MSMHR), seus moradores, seus ex-moradores, as memórias individuais e coletivas, seus eventos, suas lutas, conquistas e derrotas, seus becos, suas vielas e a Estrada da Gávea, suas biroscas, suas creches, as pessoas que tomam conta de crianças, as parteiras, em suma suas relações sociais e sua cultura local”, afirma Fernando Ermiro, historiador e integrante do projeto.
Você se lembra como era a Rocinha há 10, 20, 30 ou 60 anos atrás?
O MSMHR existe para conservar esse passado e fazer com que fiquem disponíveis para você que está conhecendo a comunidade agora ou para quem viveu esses momentos bons e ruins na favela. O objetivo do projeto é trazer exposições educativas e sociopolíticas, publicações e pesquisas relativas à memória e história, em especial do bairro sede e adjacências.
Seus seis integrantes (José Martins, Maria Helena Carvalho, Antônio Carlos Firmino, Fernando Ermiro, Marcos Burgos e José Ricardo), moradores da comunidade, recebem e conservam todo tipo de material de arquivo, além de relatos e memória gravadas ou escritas. O acervo é composto por fotos antigas cedidas por moradores, documentos históricos, matérias de jornais, trabalhos acadêmicos relacionados à comunidade, relatos de moradores etc. Com isso, realizam exposições para que os moradores possam relembrar o que mudou e o que permanece intacto na composição urbana e social do local.
Atualmente, o museu é um movimento social em vias de se tornar uma ONG. De acordo com Fernando, a transformação em pessoa jurídica facilita a captação de recursos para a execução dos projetos e das ideias que surgem das conversas com os moradores. O grupo ainda não tem uma sede, mas já conta com um projeto desenhado com a assinatura do arquiteto e parceiro do museu Mauro Guaranys, o mesmo que planejou o prédio do C4 Biblioteca Parque da Rocinha.
“As negociações para a sede já estão adiantadas, já tivemos o aval da gerencia de museus do Rio, da Geo-Rio e da gerencia de patrimônio da prefeitura do Rio. Estamos na fase de liberação do terreno e seguiremos para captação de recursos para construção do prédio que será agregador de diferentes formas de artes e expressões”, revela Fernando.
A memória é um direito de todos e o projeto traz essa ideia para o âmbito da favela, a qual teve durante anos a história relacionada com a violência. As pessoas poderão refletir sobre elas mesmas, seu papel na cidade e como mudar sua realidade, comenta Antônio Carlos Firmino, um dos fundadores do Museu.
O museu utiliza o adinkra (sistema de escrita pictórico) Sankofa para representar o projeto. A filosofia que este símbolo exprime diz muito sobre o MSMHR. O pássaro africano com a cabeça virada para trás pegando um ovo, segundo a mitologia dos Povos Akan, grupo étnico e linguístico da África Ocidental, significa, aproximadamente, voltar ao passado para ressignificar o presente.
“Quando penso no museu Sankofa não penso unicamente na Rocinha, vejo suas conexões com a Cidade do Rio de Janeiro, com os índios Tupinambás que aqui viveram, com o Brasil inteiro e suas migrações, com o mundo e suas migrações internacionais” explica Fernando.
Como a ideia surgiu?
O ponta pé inicial para idealizar o Museu Sankofa se deu em 2008, depois da iniciativa de fazer um centro de memória e história da Rocinha. Mas de acordo com Firmino, as primeiras iniciativas de preservação da história da Rocinha são anteriores a esse fato.
“A ideia de manter a memória e a história da Rocinha é anterior a criação do grupo Pró Museu. Já na década de 1970, alunos de alfabetização de adultos da escola comunitárias Ação Social Padre Anchieta (ASPA), estimulados pela professora Lygia Segala, iniciam uma pesquisa sobre histórias de vidas de moradores e contribuem para a produção do livro Varal de Lembranças (1983)”, diz Firmino.
Depois do livro, surgiram iniciativas de fomento e preservação da memória, como na década de 1990 quando um grupo de moradores – militantes da cultura, artistas e universitários – fazem reflexões sobre a importância das Memórias e Histórias da Rocinha. Em 2004, foi realizada uma atividade organizada pelo Centro de Cultura e Educação Lúdica da Rocinha, coordenado pela ASPA, e Centro Internacional de Estudo e Pesquisa sobre a Infância (CIESPI) para resgatar brincadeiras e cantigas, com o propósito de trabalhar a memória infantil.
Em 2008, surge o Grupo Pró Museu da Rocinha que passa a se debruçar sobre o direito pela memória e história da região onde hoje é a Rocinha. Em 2009, ocorre o inicio da parceria com a professora Lygia Segala através do Laboratório de Educação Patrimonial da Universidade Federal Fluminense (LOBEP/UFF) e a produção de um texto para um Programa de Extensão Universitária Cultural.
Daí em diante o grupo realizou as primeiras ações: reuniões com o Departamento de Museus (DMU/IPHAN), em 2010 iniciam os Chás de Museu com mostras dos arquivos do acervo. Depois desse início fixam, em parceria com artistas da Rocinha, as memórias e histórias através do Mega Muro da Curva do S, na Estrada da Gávea; e em 2011 publicam o Livro Memória Feminina em Três Tempos, organizado por Fernando Ermiro.
Este documento da UPMMR são muito interessantes para o debate sobre o papel da Associação de Moradores da Rocinha e recente democratização do Brasil.
Muito bom Beto. Sem vocea jamais teamiros estes momentos registrados. Espero que a ABES tenha como armazenar este acervo para no futuro relembramos o nosso passado. As coisas boas que estamos fazendo Uma abrae7o, Vitorio.