Se você é um fã mais antigo de jogos eletrônicos sabe o quão difícil era ter um videogame em casa há 20 anos. Até os que tinham Super Nintendo ou Mega Drive precisavam disputar a TV com o restante da família para poder jogar. Porém para alegria de muitos, surgiam nos anos 90 os fliperamas, uma forma democrática que permitia que qualquer um jogasse por horas com a galera da rua. Mas será que ainda hoje, com os avanços tecnológicos, é possível encontrarmos lugares como esse?
Não é preciso ir muito longe para se conectar com o passado e o presente dos games. Travessa Oliveira, número 11 102, lá se encontra o Fliperama Rock Games, cuidado com paixão por Ivan Rocha de 36 anos, um amante dos jogos. Em conversa, ele nos conta das dificuldades dribladas na época para se poder jogar.
“Esse lance do Fliper começou mais ou menos na década de 90. A gente jogava num fliperama ali em cima, no Boiadeiro, chamado Fliperama do Arthur. Na época, o Street Fighter era um jogo de 6 botões, e a gente jogava com 4 botões só porque não tínhamos muito recurso ”
“Eu comecei a ter meu fliperama nos anos 2000. Fui mandado embora do meu emprego, tinha uma graninha e conhecia um fornecedor de fliperama. Como nessa época o fliperama tava em alta, eu juntei uma coisa que eu sempre gostei e comecei a trabalhar com Fliper.”
Estabelecimentos como esse ganharam notoriedade nesse período. Era a nova forma de lazer, sem precisar correr ou se cansar fisicamente, mas com a mesma rivalidade de brincadeiras como futebol e queimado, por exemplo. As mães, que no começo tinham repulsa ao se preocupar com a saúde de seus filhos, aos poucos iam se rendendo àquela poderosa caixinha elétrica que conseguia aquietar os pestinhas. Com o tempo, as coisas iam evoluindo, novos jogos lançados, a industria ia entendendo como atender as necessidades desse público.
Ivan afirma como o avanço tecnológico moldou o mercado do fliperama. Antes máquinas grandes que se jogavam de pé e tinham jogos mais desafiadores, depois os videogames com produções mais cinematográficas, jogos mais fáceis e que permitiam ser jogados sentado. Com a chegada da internet, permitiu-se jogatinas online, feitas em casa, o que preocupava os donos de Fliper até então.
“Mais futuramente, eu entrei com o vídeo game porque o mundo do Fliperama ficou muito decaído por conta do crescimento dos jogos online. Mas os vídeo games vieram pra salvar isso.”
“No meu tempo fliperama era coisa de centavos, você jogava aquele centavos na sua capacidade máxima. Não tinha essa coisa de “vou salvar o game ali, vou dar um ‘continue’ e continuar o jogo”. Era aquilo: Você pegava uma ficha, passava 3 horas na máquina e ficava ali até você zerar ou você colocar um recorde muito alto.”
“O game antigo é mais difícil que os games de agora. Mas para mim também os games de agora são super fantásticos. Resolução ótima, os jogos têm uma história bacana, praticamente você joga e ao mesmo tempo vê um filme.”
Hoje aquilo que era brincadeira de criança se torna fonte de renda para muitos adultos, que podem jogar com estádios de futebol lotados de fãs, que vão ver os embates virtuais. Essa legião de fãs só é possível graças à influência de mídias como YouTube e Twitch TV, plataformas que transmitem partidas desses jogos e que aos poucos foi conquistando e incentivando a prática de jogar.
O consumidor de fliperama também foi mudando muito, a drástica redução de estabelecimentos como esse é um sinal. Francisco Gabriel, universitário de 21 anos era um desses consumidores que migrou para a jogatina a domicílio. Ir ao fliperama deixou de ser necessidade para ele a partir do momento que teve oportunidade de ter um console de videogame próprio.
“Então, eu frequentava na época praticamente porque não tinha videogame e eu nunca fui um cara de ficar brincando na rua, mas, de vez em quando, pra ter uma variedade, eu procurava ir ao fliperama.”
“Com o passar do tempo, eu comecei a jogar os mesmos jogos que eu jogava no fliperama em casa, no meu computador. Antigamente, na época do fliperama, nem todos os jogos que tinha pra videogame específico, tinha pra computador, ou era meio difícil ter acesso a jogos de computador.”
Chico analisa essa mudança de perfil do consumidor, segundo ele motivada por adventos da tecnologia. Valoriza o contato presencial do fliperama, ausente nas partidas online.
“Assim, na verdade o que mudou um pouco é aquele fã raiz, aquele cara que gosta de estar ali com outras pessoas, jogar num ambiente diferente. O cara das antigas continua indo. A galera nova é mais para se entreter, sabe? Fliperamas não tem essa questão do online mas tem uma coisa muito legal que é a coisa do pessoal, do presente, sabe ? Você pode jogar com uma pessoa que você não conheça, ou você pode levar alguém que você conheça, pode formar novas amizades então, o online só perde pro fliperama por causa disso.”
Apesar de ser mais raro, conseguimos achar ainda fliperamas, como o do Ivan, para se jogar com a galera. Seja a velha geração que gostava de jogar Street Fighter ou Mario Bros, seja a nova geração que curte jogos como Fortinite e League of Legends. O importante é que momentos como os que vimos na produção dessa matéria, de crianças e adolescentes felizes em confraternização, devem ser preservados na sociedade. Além de paz, o povo merece no mínimo um sorrisão no rosto.
Imagens: Chico Gabriel